O mercado de apostas esportivas disparou no Brasil nos últimos anos. E com tanta gente apostando, o debate esquentou quando o Banco Central divulgou um dado preocupante: só em agosto de 2024, beneficiários do Bolsa Família teriam transferido cerca de R$3 bilhões via Pix para casas de apostas.
O setor não ficou quieto. O Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR) questionou esse número e afirmou que o gasto real (descontando os saques) seria bem menor, por volta de R$210 milhões mensais. Essa diferença mostra o quão difícil é saber exatamente o impacto financeiro real.
Pode apostar com dinheiro do Bolsa Família?
O dinheiro do Bolsa Família não pode ser usado para fazer apostas... mas os beneficiários do programa podem apostar. Isso torna a situação bastante complexa.
Na teoria, é proibido. A nova lei das apostas e decisões judiciais posteriores deixam claro que o dinheiro do Bolsa Família não deve ser usado em apostas. Em junho de 2025, a Justiça Federal determinou que todos os sites de apostas exibam avisos fixos dizendo que é proibido usar dinheiro de programas sociais pra esse fim.
Na prática, a história é outra. O benefício é depositado numa conta bancária comum, como qualquer outro valor. E, até agora, não existe nenhum sistema automático que consiga impedir que esse dinheiro vá parar em sites de apostas. Ou seja, mesmo sendo proibido, ainda dá pra fazer... e é justamente isso que tem preocupado autoridades, juristas e a sociedade.
Essa distância entre o que diz a lei e o que acontece no dia a dia levou à adoção de novas medidas judiciais e ao surgimento de propostas de mudança.
Novas decisões judiciais (junho 2025)
Em 24 de junho de 2025, a Justiça Federal de São Paulo determinou que todas as plataformas de apostas exibam alertas visíveis e permanentes informando que é proibido usar recursos de programas assistenciais em apostas esportivas.
- As empresas têm 45 dias para cumprir a ordem.
- Caso descumpram, serão multadas em R$500 mil por dia.
Outros pedidos mais drásticos, como o bloqueio de cadastros com base nos CPFs do CadÚnico ou a suspensão de campanhas publicitárias direcionadas a beneficiários, foram rejeitadas pelo juiz, por entrarem em conflito com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e direitos individuais.
Medidas do governo em discussão
Com o avanço das apostas no país e os riscos de uso indevido do Bolsa Família, o governo e outras instituições começaram a discutir formas de impedir esse tipo de prática. Apesar da proibição já existir na teoria, ainda faltam mecanismos práticos de controle. A seguir, estão as principais propostas que estão sendo analisadas:
- Monitoramento de transações: criar sistemas para identificar e bloquear transferências feitas com recursos de programas sociais para sites de apostas.
- Restrições por CPF: vincular os CPFs de beneficiários do Bolsa Família em uma base nacional de restrição, impedindo o cadastro ou depósito em casas de apostas.
- Sistema de verificação automatizada (API): permitir que as plataformas consultem, de forma segura e sem expor dados sensíveis, se o CPF do usuário está ativo em algum programa social.
- Bloqueio de meios de pagamento ligados ao benefício: ampliar restrições já existentes (como a proibição de cartões de crédito), passando a vetar também cartões de débito vinculados ao Bolsa Família.
- Educação e suporte: ações de conscientização financeira e acompanhamento de beneficiários que apresentem sinais de comportamento compulsivo com jogos de azar.
E as casas de apostas, têm feito algo?

Email da KTO informando seus usuários da atualização dos Termos & Condições
As principais casas de apostas se apressaram em adaptar seus sites e termos de uso. Muitas já atualizaram seus termos e condições deixando claro que é proibido utilizar dinheiro proveniente de programas de assistência social para apostas. Além disso, começaram a exibir os avisos exigidos pela decisão judicial em locais visíveis nas plataformas.
Esse movimento mostra que a regulamentação funciona. As operadoras licenciadas responderam rapidamente às exigências legais e demonstraram alinhamento com as regras em vigor.
Por outro lado, é importante destacar que os beneficiários do Bolsa Família ainda podem criar contas e apostar nesses sites, desde que não usem o valor recebido pelo programa. O que é impossível de detetar...
Conflito moral: liberdade ou responsabilidade?

Essa é a grande questão. De um lado, está o direito do beneficiário de usar seu dinheiro como quiser. De outro, a responsabilidade do Estado de garantir que o Bolsa Família seja usado pra aquilo que ele foi criado: comida na mesa, educação e saúde.
As decisões mais recentes apontam para um caminho de conscientização e regulação com mais cuidado, sem intervenções automáticas por enquanto. Mas o assunto está longe de ser encerrado. A tendência é que o governo e o Congresso avancem nas propostas para equilibrar liberdade individual e proteção social.